América Futebol Clube

América Futebol Clube - São José do Rio Preto

 
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Da bebedeira ao pânico
quinta-feira, 13 de março de 2014
 
 

Houve um tempo em que a venda de cerveja dentro dos estádios de futebol não era a maior das preocupações das autoridades. Muito pelo contrário: ela fazia parte do ritual futebolístico pelos quatro cantos desse país. Tomar uma cerveja gelada num campo de futebol não era o fim da picada que é hoje. Lógico que havia excessos mesmo àquela época – tanto é verdade que um desses excessos é o que motivou esse texto –, mas foi só depois que as torcidas organizadas ganharam força dentro dos estádios (e dos clubes) que esse hábito começou a ser questionado, até a sua completa proibição. Afinal, junto com a força das organizadas, veio também a violência (na grande maioria das vezes extremada).

As tardes de domingo de São José do Rio Preto, com raras exceções, eram, são e sempre serão muito quentes. Some-se a isso um jogo do América no estádio Mário Alves Mendonça, as tradicionais conversas fiadas entre amigos, os bares oferecendo o tão desejado líquido devidamente gelado e a um preço aprazível e záz! Poucos resistiam ao apelo e acabavam tomando a sua loira gelada. O problema é que, a partir daí, começava também um dilema: como conseguir fazer o seu xixi nos sanitários do estádio do Mecão? Afinal, com o M.A.M. lotado, chegar ao banheiro para aliviar a bexiga, passando por entre outros torcedores naquela arquibancada acabrunhada e quase vertical, era um passeio indigesto. Eis que nasceu, então, um mau hábito que o tempo e a boa educação trataram de enterrar: o de urinar dentro de algum copo vazio de cerveja e jogar o trambolho lá embaixo na cabeça de algum pobre infeliz. Quem optava por fazer a peripécia de arremessar tão desagradável artefato, tomava o cuidado de fazê-lo de maneira velada, postando-se nos degraus mais altos. Esse procedimento adotado pelos "arremessadores" se fazia necessário para que, obviamente, não fossem flagrados praticando tal delito e evitassem prováveis dissabores caso fossem identificados pela polícia... ou mesmo por aqueles que eram agraciados com aquele maldito "banho".

Numa dessas tardes infernais, mais especificamente em um domingo de 1984, nosso templo estava bem cheio para um jogo entre América e XV de Jaú. O América do técnico Candinho estava fazendo uma belíssima campanha, com vitórias importantes sobre o São Paulo (no M.A.M.) e Corinthians (no Pacaembu), o que explicava a presença de um ótimo público.

Nesse dia em especial, algo diferente aconteceu. Notei um sujeito bêbado a uns quinze metros de onde estávamos eu e meu pai. Apesar do meu nervosismo com o 0x0 que teimava em se manter no placar, a imagem de um bêbado balbuciando palavrões era um grande barato para um garoto de 12 anos (no caso, eu). Eis que, do nada, o sujeito sossegou. Sentou e pediu o que imaginei ser um copo a alguém que estava ao seu lado. Concluí, obviamente, que ele estava se transformando de "torcedor do América" para "arremessador de urina". Por estar bem mais alterado do que o normal, o indivíduo optou por nem subir até o nível mais alto das arquibancadas: sentado, fez o seu "xixizinho honesto" dentro do copo de cerveja vazio e, sem nenhum remorso, algo esperado para quem estava naquele estado etílico, mandou-o lá pra baixo. 

Agora vem a pergunta: qual era a chance desse sujeito se safar de arrumar um belo aborrecimento, já que fez o arremesso do seu copo em pé, no meio da arquibancada de um estádio pequeno e com um público pagante de mais de dez mil pessoas?

O copo cheio de urina voou, voou, voou...  Segundos depois, o artefato se estatelou no alambrado lá embaixo, molhando sua pobre vítima: um sujeito enorme, daqueles que fazem um guarda-roupa parecer um criado-mudo. Os braços do indivíduo eram do diâmetro da perna de um homem adulto. A urina do bêbado respingou em mais gente ali no alambrado, mas esse, por conta de seu tamanho avantajado, foi mais, digamos, "agraciado".

 

 Ao fundo na foto, os torcedores assistindo a um jogo do América contra o Santo André em 1993,

encostados no alambrado enferrujado do estádio Mário Alves Mendonça (fonte: desconhecida).  

 

O “Tanque Panzer”, todo ensopado, chacoalhou os braços tentando, de alguma maneira, se ver livre daquela fedentina. Pouco depois, olhou para o alto da arquibancada.  Os olhos esbugalhados, quase saltando para fora do rosto redondo, eram uma mescla do mais puro ódio e da mais profunda esperança: a de identificar quem o deixara naquele estado lastimável.

Eis que, para seu deleite, pode-se notar uma centena de braços delatando o arremessador etílico.  Para a alegria do bom-senso, não eram todos os torcedores do América que compactuavam com aquele ato indecente. Imediatamente, o “guarda-roupa” pôs-se a subir as arquibancadas, rumo a seu agressor.  A cada degrau pisado pelo brutamonte, a torcida urrava, tal como romanos prestes a ver uma luta de gladiadores no Coliseu.    E o bêbado observava, já devidamente sentado e de maneira inerte e impassível, sua bebedeira se transformar em pânico.  Ao ficarem cara-a-cara, a desproporção do porte de ambos era tão gritante que imagino que o gigante “Golias” teve pena do seu minúsculo oponente “Davi”.  Ainda assim, o grandalhão não se furtou de erguer o bebum pela gola da camisa com apenas uma das mãos, tal como qualquer um de nós faz quando pega um gato pelo cangote.  De posse da sua presa, pôs-se a descer as arquibancadas.  Sob aplausos de alguns e risos de muitos, entregou o “mijão”, enfim, aos policiais que lá estavam presentes.  Terminado aquele espetáculo bizarro, voltamos os olhos para o gramado... e não restava muito mais para se ver do jogo, que terminou mesmo em 0x0. 

Meu pai, homem de poucas palavras, ainda usou o episódio para soltar um inesperado comentário bem-humorado a um colega, após o jogo terminado e enquanto deixávamos o estádio: “Tá vendo, Zé: beber demais pode te fazer mal aos dentes...”.  O tal de Zé ainda se deu ao trabalho de perguntar: “Por quê?”.   Ao que meu pai respondeu: “já imaginou tomar um sopapo no meio da boca de um ‘caminhão’ daqueles?”.  

 

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