Dizem que para fazer uma boa campanha e lutar por títulos, uma equipe precisa ter planejamento, estrutura, iniciar a preparação com bastante antecedência e selecionar a dedo os seus jogadores. Mas para toda regra há exceção. Maior prova disso foi o time sub-19 do América formado às pressas para disputar a Copa São Paulo de Juniores de 2006 e que surpreendeu a todos ao conquistar invicto o caneco. Pois é. Parece que foi ontem, mas o tempo voa e já se passaram longos dez anos.
A 35 dias do início da disputa, a diretoria contratou o técnico José Cândido Farias, o Candinho, que havia sido campeão invicto (sete vitórias) dos Jogos Abertos do Interior com o Santo André. Ao terminar o evento em Botucatu, Candinho pegou carona até Rio Preto com Alcides Zanirato, então presidente do América. No caminho, o cartola convidou o treinador, que a princípio, recusou. Porém, alguns dias depois, Candinho rompeu o vínculo com o clube andreense por divergências com a diretoria.
“Eles queriam reintegrar ao elenco dois jogadores que eu tinha liberado por indisciplina”, informa. Assim, decidiu aceitar o convite. “O América não tinha nenhum jogador”, recorda. “Eu trouxe Leandro Frutal e Wellington (zagueiros), que tinham sido dispensados pelo Santo André”, disse. O Vermelhinho conseguiu o empréstimo do goleiro André Zuba junto ao Palmeiras. “O Palmeiras inscreveu três goleiros e o Zuba ficou fora”, recorda Candinho.
“Eu já o conhecia, resolvi trazê-lo e ele foi o melhor goleiro do campeonato”, destaca. O Rio Preto emprestou o volante Leandro Rincón (volante), o Mirassol cedeu Régis, Gilmarzinho, Elias Negão, Jeferson, Nenê e Júlio César. Além de ser formado a toque de caixa e, mesmo como anfitrião, havia outra incógnita. O time havia treinado só duas vezes no Teixeirão e encarava o local como um campo neutro. A equipe mal sabia que o estádio faria diferença até a semifinal.
Com o apoio de 5 mil pessoas, ganhou de 3 a 0 do Cuiabá, que contava com o zagueiro Ferron, hoje na Ponte Preta. Na sequência, fez 2 a 1 sobre o Guarani, do experiente treinador Júlio de Toledo Piza, pai do técnico Evaristo Piza, ex-Mirassol e que está no Capivariano. O regulamento previa a classificação do primeiro colocado de cada um dos 22 grupos e dos dez melhores segundos colocados. Bastava um empate diante do Cruzeiro na última rodada da primeira fase para se classificar.
Na véspera, o técnico Ricardo Drubscky contraiu pneumonia e deixou o time cruzeirense, sendo substituído pelo auxiliar Enderson Moreira. No ano passado, Drubscky estava no time principal do Fluminense, enquanto Moreira hoje dirige o Goiás. A equipe mineira contava com os zagueiros Thiago Heleno e Leandro Amaro, e com os atacantes Tadeu e Guilherme. Nada disso adiantou. Soberano, o América impôs 5 a 1 e avançou.
América 5 X 1 Cruzeiro - 10 de fevereiro de 2006
Ficha técnica:
América
André Zuba; Régis, Polly e Wellington; Gilmarzinho (Juninho), Leandro Frutal, Jeferson, Nenê e Eder; Júlio César (Cristiano) e Stênio (Weslei). Técnico: Candinho Farias.
Cruzeiro
Flávio; Nego, Leandro Amaro, Thiago Heleno e Edimar; Cleberson, Charles (Juninho), Carlos (Talles) e Guilherme; Tadeu e Zé Eduardo (Fabinho). Técnico: Enderson Moreira.
Gols: Leandro Frutal aos 13 e Nenê aos 22 minutos do 1º tempo. Tadeu aos 11, Weslei (pênalti) aos 28, Gilmarzinho aos 38 e André Zuba (pênalti) aos 45 do 2º tempo. Árbitro: Júnior César da Silva. Expulsões: Cleberson, Juninho e Thiago Heleno. Local: Teixeirão, em Rio Preto, na terça-feira, 10/2/2006, na 3ª rodada da 1ª fase, quando o América embalou rumo ao título.
Time passou sufoco no mata-mata
Na segunda fase, o América fez 2 a 1 no Botafogo, de Ribeirão Preto, e nas oitavas de final encontrou o Fortaleza, que havia eliminado o Corinthians nos pênaltis. O time cearense tinha como técnico Daniel Frasson, ex-jogador do Palmeiras. O Rubro mostrou poder de reação ao vencer de virada por 3 a 1. Nas quartas, a equipe rio-pretense passou sufoco novamente diante do Paulista, de Jundiaí, do técnico Palhinha, ex-jogador do São Paulo, e do volante Jairo, que depois jogou no Mirassol, mas venceu por 3 a 2, também de virada. Com o apoio de 20 mil torcedores, o Vermelhinho derrotou o Barueri por 2 a 1 na semifinal, no domingo, dia 22 de janeiro.
O Barueri, do técnico rio-pretense André de Oliveira, tinha como destaques os meias Velicka e Thiago Humberto. Na quarta-feira, dia 25, a torcida americana lotou 11 ônibus para levar incentivo à equipe na final contra o Comercial, de Ribeirão Preto, no Pacaembu, em São Paulo. A decisão foi tensa com empate sem gols no tempo normal. Nos pênaltis, brilhou a estrela do goleiro André Zuba, que defendeu as cobranças de Jonatas Mineiro e Tiago Tremonti para garantir a vitória por 3 a 1. Foi o último momento de glória do América, que completou 70 anos na quinta-feira passada.
América 0 X 0 Comercial - 25 de janeiro de 2006
Ficha técnica:
América
André Zuba; Régis, Polly e Wellington (Rafael); Gilmarzinho (Weslei), Leandro Rincón, Elias Negão, Jeferson e Nenê (Eder); Júlio César e Cristiano. Técnico: Candinho Farias.
Comercial
Anderson; Ederson (Danilo), Paulo Ramazza (Gabriel), Henrique e Guina; Bruno, Diogo, Jonatas Mineiro e Victor; Paulinho (Tiago Tremonti) e Buiú. Técnico: Macalé.
Árbitro: Marcelo Rogério. Pênaltis: 3 a 1 para o América. Weslei, André Zuba e Polly (América) e Henrique (Comercial) converteram. Júlio César (América), Jonatas, Tiago Tremonti e Diogo (Comercial) erraram. Público: cerca de 18 mil pessoas. Local: Pacaembu, em São Paulo, na quarta-feira, 25/1/2006, na final da Copinha.
Poucos atletas estão na ativa
Mesmo sendo a maior vitrine para revelar talentos, aquela façanha não rendeu frutos ao América. Dos 11 titulares, apenas os zagueiros Wellington e Polly, e o atacante Cristiano eram vinculados ao clube. Alguns ainda peregrinaram por equipes do Interior, mas a maioria já pendurou as chuteiras. O zagueiro Régis estava no América de Morrinhos-GO, o meio-campo Jeferson, no Concórdia-SC, e o goleiro André Zuba, que defendeu o Guarany de Sobral-CE, ainda estão na ativa. Assim como atacante reserva Luís Gueguel, que disputa o A-3 deste ano pelo Atibaia.
Em levantamento recente, o repórter Carlos Petrocilo descobriu que Wellington hoje é corretor de imóveis em São Paulo. Gilmarzinho é encarregado de produção numa fábrica de móveis em Mirassol, Leandro Rincón comercializa produtos de limpeza em Rio Preto e Elias Negão trabalha na empresa de laticínio do pai em Jaciara-MT. Cristiano parou de jogar recentemente e mora em Guaimbê, na região de Marília. O zagueiro Polly mora em Maceió. O meia Nenê montou uma escolinha de futebol em Montes Claros-MG e o atacante Júlio César trabalha numa empresa de arquitetura e topografia em Rio Preto.
Depois do título, o técnico Candinho Farias assumiu o profissional do Guaratinguetá. “Peguei a equipe em penúltimo lugar na Série A-2. Reagimos, ganhamos cinco jogos e empatamos três”, recorda. “Aí, uns diretores quiseram impor a escalação de dois laterais e eu saí”, acrescenta. Ele ainda comandou São Bernardo, Olímpia, Sorocaba, Catanduvense, Barbarense e América. No ano passado, dirigiu Tupã e Guaratinguetá. “Fiquei sem receber nos dois clubes e desanimei”, afirmou. À espera de novos desafios, ele leva a vida ao lado da família na pequena Poloni. “Continuo com o cabo da enxada na mão”, diz.