Aproveitando o mês de aniversário do América, que completará 68 anos no próximo dia 28, a coluna Flash Bola inicia hoje uma série especial - em três edições - para falar sobre o primeiro patrimônio do clube, o estádio Mário Alves Mendonça, que foi construído com muito empenho, dedicação, doações, suor e recursos dos dirigentes. Palco de memoráveis batalhas até 1996, no “Caldeirão do Diabo” o América viveu momentos de glória. Hoje, iremos tratar exclusivamente da inauguração.
Potência regional desde a sua fundação, o Rubro carecia de uma praça esportiva. Dependia da cessão de campos de outras agremiações para mandar seus jogos. Então, diretores etorcedores se uniram com o propósito de construir um estádio para o Vermelhinho.
Pelo livro de atas das reuniões da diretoria e do Conselho Deliberativo, o plano começou a ser colocado em prática em 30 de setembro de 1946. Havia sido oferecida uma área ao clube na Vila Esplanada. No entanto, o presidente Mário Alves Mendonça optou pelos lotes de José Diniz e José Pedro Leme. O lugar escolhido não poderia ser melhor: a Vila Santa Cruz, chamada na época, de “alto da cidade”, em razão da visão panorâmica que se tinha de todo centro da “Capital da Araraquarense”.
Mendonça, que teve papel saliente na compra do terreno, nomeou uma comissão para tratar do assunto. Manoel Reverendo Vidal Filho, Antonio Tavares Pereira Lima, Jamil Temer Nasser, Eduardo Ferreira Fonte e João Durvalino Sestini integraram a comissão responsável pela análise da negociação.
Graças aos recursos obtidos com as mensalidades dos associados, além de rifas e outras promoções, o clube comprou de João Pedro uma gleba de terra, da rua Jorge Tibiriçá para o Cemitério da Ressurreição, na Vila Ercília. Também adquiriu a outra área de José Diniz. Em nenhuma ata constam os valores pagos.
Com 24 mil metros quadrados, o terreno era suficiente para abrigar a tão sonhada praça de esportes. Só os serviços de nivelamento e terraplanagem custaram 50 mil cruzeiros. Pelo projeto original, elaborado pelo engenheiro e fundador Pereira Lima, também seriam construídos quadras de basquete, vôlei, tênis, estacionamento, pista de atletismo e sala de ginástica (academia), que, no entanto, não saíram do papel. A diretoria teve o capricho de instalar uma cabine de rádio e som interno, além do campo, das arquibancadas e vestiários.
Em 9 de junho de 1947 foi lançada a campanha pró construção do estádio, coma rifa de um automóvel Ford, modelo cupê, zero quilômetro. Com êxito na receita, Mendonça empolgou. Com a cara e a coragem, o cartola fez um empréstimo de 100 mil cruzeiros junto ao Banco Paulista do Comércio, ficou responsável pelo pagamento das parcelas e chegou a comprometer suas finanças pessoais. O dinheiro foi utilizado para comprar outro automóvel, geladeira, rádio-vitrola, máquina de costura e bicicleta, que foram sorteados em outra rifa.
Voluntários fizeram mutirões, a prefeitura cedeu mão de obra e, aqueles com mais posses, forneceram material e dinheiro. Os Irmãos Tonello, que tinham uma loja de materiais de construção, doaram 10 mil tijolos, mas eram necessários 200 mil. Os irmãos Antonio e Francisco Curti doaram os portões e as bilheterias.
Boa parte do madeiramento foi dada por JoséTijo Villanova Perez, construtor e que possuía uma grande serraria. Anos depois, inclusive, (de 1957 a 1959 e entre 1961/1962), ele presidiu o América. Francisco Curti também foi presidente por duas gestões (1949/1950 e 1953/1954).
O gramado recebeu os cuidados do agrônomo Júlio Amaral, prometendo “o melhor piso do interior paulista”. Com capacidade para 3 mil pessoas, as arquibancadas eram de madeira e tinham seis degraus, que mais lembravam um galinheiro. Mas era o melhor que se podia oferecer na época. Também foi instalado um cercado de madeira em volta de todo o campo.
Casa cheia na inauguração
Com tudo pronto, a inauguração do estádio foi marcada para o domingo, dia 27 de junho de 1948, com o amistoso entre América de Rio Preto e o seu “xará" do Rio de Janeiro. Pela manhã foi realizada uma extensa programação, com o bispo diocesano dom Lafaiete Libânio fazendo a bênção da nova praça de esportes. Fizeram pronunciamentos o prefeito Cenobelino de Barros Serra, o então vereador Alberto Andaló, Mário Alves Mendonça, Luiz Fleury, Lázaro de Camargo Encke, Domingos Tedeschi (presidente do Rio Preto) e um representante do clube carioca.
O jogo aconteceu à tarde, com lotação máxima no novo estádio do Vermelhinho. O time rio-pretense estava desfalcado do goleiro titular Tino, contundido. Sandro, do Olaria do Rio de Janeiro e que estava em Rio Preto, foi convidado para substituí-lo. O meia-direita Maneco foi o autor do primeiro gol do estádio, logo aos 4 minutos do primeiro tempo. No lance, Sandro sofreu uma lesão e deu lugar para Pedrinho. O ponta-esquerda Tite empatou para a equipe local, aos 39 minutos da etapa complementar.
Patrono foi comerciante, vereador e morreu em 76
Negociante de café, assim como outro baluarte americano, Benedito Teixeira, o Birigui, vereador e, posteriormente, comerciante do ramo de bebidas, Mário Alves Mendonça foi o principal investidor para a construção. Até por isso que a diretoria decidiu homenageá-lo, dando seu nome ao estádio. Fundador e vice-presidente da primeira diretoria, ele assumiu a presidência em setembro de 1946 para substituir Antonio Tavares Pereira Lima. Incansável, com muita dedicação e competência, Mendonça foi o mandatário do clube até julho de 1949.
Com a crise financeira, mudou-se para Fronteira-MG, onde tomava conta do depósito de açúcar da Usina Guarani, propriedade de Maurício Goulart. Em 1959, Mário Alves Mendonça fixou residência em Goiânia. Abriu um comércio de açúcar e depois foi comerciante atacadista de secos e molhados. Morreu em Goiânia, em 1976, aos 62 anos, vítima de um ataque cardíaco. Deixou a viúva Iraci Coelho Mendonça, além de 13 filhos.